Segundo o índice criado pela Kogod School of Business, da American University (Washington), as montadoras instaladas nos Estados Unidos utilizam, no máximo, 81% de peças produzidas localmente. Esse número só é atingido pela Tesla, e ainda assim porque o estudo considera o Canadá como um fabricante local de componentes.
Os dados divulgados em dezembro mostram ainda que gigantes americanas internacionalizaram a fabricação de componentes, e isso é resultado do rearranjo em curso na indústria.
Em 2015, o grupo FCA (Fiat Chrysler) tinha pouco mais de um ano de existência. Naquele ano, 60% das peças de marcas genuinamente americanas como Dodge, Jeep e RAM foram “made in USA”. Em 2024, já sob o controle do grupo Stellantis, esse índice caiu para 46%, segundo a Kogod.
Na Ford, o conteúdo local passou de 65% para 54% no mesmo período, números muito próximos dos registrados pela GM (de 66% para 54%).
Se o Canadá sair da conta, é possível afirmar que mais da metade dos componentes de carros das principais montadoras americanas vêm de outros países.
Esse movimento está no centro das queixas dos sindicatos de trabalhadores do setor nos EUA, que apoiam as medidas anunciadas por Donald Trump. Os operários da indústria automotiva estão na base de eleitores do presidente republicano.
São reivindicações coerentes, mas que não podem ser resolvidas com um tarifaço. As múltiplas fusões e parcerias entre montadoras foram aceleradas com o processo de eletrificação, mas esse movimento de descentralização da cadeia de fornecedores, com fechamento de fábricas nos Estados Unidos, já é visto desde os anos 1980.
Ao reconsiderar a tributação sobre produtos de origem canadense ou mexicana, Trump resolve apenas parte do problema que está criando. Hoje, componentes eletrônicos e baterias são largamente importados da China por montadoras americanas, incluindo a Tesla.
Embora tenha produção acima da média nos EUA e no Canadá, a montadora de Elon Musk produz veículos que dependem de peças chinesas.
A versão de longo alcance do sedã Model 3, por exemplo, precisa de mais módulos de acumuladores e, por isso, tem índice de nacionalização de 67,3%, de acordo com o levantamento da Kogod School of Business.
Em qualquer situação, o aumento de tarifas pode até influenciar a retomada da indústria automotiva dos EUA, mas esse efeito só seria sentido no longo prazo.
É algo complexo em uma indústria multinacional que trabalha com previsibilidade. Uma mesma empresa fornece componentes para diversas montadoras, e isso implica parcerias comerciais entre concorrentes. Não são decisões avulsas.
O que há de iminente é o aumento dos preços de veículos comercializados nos EUA, que acumularam altas significativas ao longo da pandemia. Se esse movimento não for acompanhado por índices positivos de emprego e renda, há risco de recessão no setor automotivo, com queda nas vendas e perda de rentabilidade.