A Sabesp vai apresentar na assembleia geral marcada para o dia 29 de abril uma proposta de nova política de remuneração para os diretores e membros dos conselhos de administração e fiscal.
Privatizada em 2024, a companhia quer agora aproximar seu programa de salários e incentivos ao modelo que é praticado no mercado por empresas de porte e características semelhantes.
A proposta, contudo, vem num momento em que os funcionários da companhia de saneamento reclamam de ajustes internos da nova gestão no sentido de cortar gastos.
O documento da administração sugere aumentar o limite de remuneração do atual exercício (que acaba em dezembro de 2025) para R$ 65 milhões por ano, um salto de 600% em relação aos R$ 9,1 milhões desembolsados pela Sabesp em 2024 nessa mesma rubrica.
Desse montante, os nove membros do conselho de administração ficariam com R$ 13,9 milhões, os seis diretores com R$ 50,9 milhões, e os cinco conselheiros fiscais com R$ 750 mil.
“A administração propõe reformular a estrutura de remuneração da diretoria, com o objetivo de fortalecer o alinhamento de interesses entre administradores e acionistas e a geração de valor no médio e longo prazo”, diz o documento da Sabesp.
Os R$ 65 milhões são o limite máximo de pagamento e consideram tanto o salário fixo quanto os incentivos de curto e longo prazos. Ou seja, o valor só será efetivamente pago aos executivos se todas as metas e indicadores de performance forem atingidos.
Os objetivos que entram no cálculo incluem itens como margem Ebitda (geração de caixa), índice de coleta e tratamento de esgoto, pesquisas de clima organizacional e ocorrência de acidentes com mortes.
No caso da diretoria, por exemplo, a maior fração do salário anual virá de remunerações variáveis. Dos R$ 50 milhões previstos, 26% são fixos (R$ 13,5 milhões), 37% são incentivos de curto prazo (R$ 18,8 milhões), e 36% são incentivos de longo prazo (R$ 18,5 milhões).
Atualmente, a lógica que prevalece é a oposta: o grosso da remuneração é o salário fixo, algo incomum em grandes empresas privadas.
Em nota, a Sabesp diz que o plano foi elaborado pela maior consultoria especializada no tema no Brasil e está dentro da média do mercado privado. A companhia destacou que dois terços da remuneração variável proposta só serão pagos se a empresa, de fato, garantir que toda a população da sua área de concessão tenha acesso à água de qualidade, coleta e tratamento de esgoto até o final de 2029.
“Caso essas metas não sejam alcançadas, a companhia está sujeita a multa que pode chegar a 10% de sua receita anual, conforme prevê o contrato de desestatização.”
A Sabesp afirma ainda que o plano não é restrito aos executivos e será estendido aos demais colaboradores.
José Faggian, presidente do Sintaema (Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo), vê na proposta de nova política uma incoerência.
Segundo ele, há mudanças sendo feitas pela nova gestão da companhia que vão no sentido oposto, de corte de gastos. É o caso dos planos de saúde. Faggian diz que a Sabesp contratou para a alta direção um plano executivo do Bradesco, que é considerado um dos mais completos do Brasil, enquanto cortou a opção mais vantajosa que existia para os novos funcionários —deixando apenas as mais básicas.
De acordo com o presidente, a companhia de saneamento costumava ofertar três alternativas aos funcionários, que variavam de preço e cobertura. Agora, o chamado “plano 3”, que incluía a melhor rede de atendimento e os melhores hospitais, foi extinto.
“Isso já serve para os novos funcionários que estão entrando. Para os que permanecem, essa mudança será realizada no meio do ano”, diz.
Em nota, a Sabesp afirma que o plano de saúde está passando por um processo de reestruturação, “com o objetivo de garantir um atendimento de qualidade aos colaboradores, ao mesmo tempo em que se estabelece um controle mais eficiente dos custos para a companhia e para os colaboradores.”
Segundo a companhia, o novo plano será 100% custeado pela empresa, enquanto o atual exige um desembolso que vai de 0,6% até 4% do salário de cada profissional.
“Embora os estudos ainda estejam em andamento, as análises preliminares indicam que o novo modelo não deverá gerar custos adicionais aos colaboradores.”
Outro tema incômodo, segundo Faggian, é o novo plano de carreira, que provocaria um “achatamento” dos salários no longo prazo, mesmo sem mexer nos pisos.
“Quando você vai ver a evolução da carreira, a diferença no final é grande em relação ao que se tem hoje”, diz. “E na outra ponta acontece isso: a alta administração da Sabesp sendo agraciada com esse aumento exponencial de rendimento”, acrescenta.
Faggian diz que as novas contratações já estão sendo enquadradas no novo plano de cargos e salários.
No entanto, a Sabesp afirma que o modelo ainda está em fase final de elaboração, também com apoio de uma consultoria. “Até o momento, não há qualquer definição ou previsibilidade de ajustes salariais para os colaboradores que já integram a estrutura atual.”
As reclamações internas chegam até ao cafezinho. Segundo o presidente do Sintaema, a Sabesp tinha um contrato de máquinas automáticas nos escritórios, com opções de bebidas (cappuccino, café com leite, café puro) que ficavam disponíveis gratuitamente para os funcionários.
“Agora eles tiraram as máquinas e estão fazendo um novo contrato. [Quando voltar] só o café puro vai ser de graça, as outras alternativas serão cobradas”, afirma.
Questionada pela Folha, a Sabesp negou que o café gratuito tenha sido retirado. “O que ocorre, no momento, é um período de transição necessário após a apresentação de uma proposta de renovação contratual com valores considerados abusivos por parte do fornecedor anterior de café expresso.”
A empresa disse ter começado um novo processo de cotação e que, nesse período, o atendimento está mantido por meio do serviço de copeiros, sem custo. “Em até 90 dias, a previsão é que novas máquinas, mais modernas e com opções ampliadas de bebidas quentes e frias, sejam instaladas”, afirma.