Varejistas dos Estados Unidos estão alertando para uma enxurrada de aumentos de preços e escassez de produtos já neste mês como resultado das tarifas de Donald Trump.
Algumas lojas estão se preparando para aumentar os preços dentro de duas semanas, à medida que a ameaça de tarifas de até 125% aumenta seus custos, de acordo com o Budget Lab da Universidade Yale, agravando a inflação persistente que já forçou muitos consumidores a limitar gastos.
Mesmo depois que o presidente dos EUA anunciou uma pausa de 90 dias em tarifas adicionais na quarta-feira (9), a tarifa geral restante de 10% sobre a maioria das importações aumentará os preços em 2,9% no total, custando à família média US$ 4.700 (R$ 27,5 mil) por ano, estima o centro de pesquisa.
“Isso é quase 18 meses de inflação normal acontecendo em um período muito curto”, diz Ernie Tedeschi, diretor de economia do Budget Lab.
Embora a ameaça de tarifas tenha agitado Wall Street por dias, o pior ainda está por vir. As primeiras mudanças seriam na seção de hortifrutigranjeiros, onde os aumentos de preços começariam antes do final do mês, estima Tedeschi. Os EUA importam 59% das frutas frescas e 35% dos vegetais consumidos pelos americanos, de acordo com o departamento de agricultura.
O Walmart disse esta semana que provavelmente haverá “impactos nos preços” devido às tarifas, mas o diretor executivo Doug McMillon afirmou que o maior varejista dos EUA procurou mantê-los o mais baixo possível, inclusive gerenciando a cesta de produtos que vende.
A Kent International, um dos maiores fabricantes de bicicletas dos EUA, disse que os preços em todo o setor aumentariam até 50% a menos que ocorra redução de tarifas.
Os varejistas estocaram inventário no final do ano passado temendo que as tarifas e uma greve trabalhista nos portos da costa leste pudessem atingir as cadeias de suprimentos. Além dos produtos perecíveis, a maioria já tem estoque suficiente para sobreviver grande parte do verão, de acordo com Jonathan Gold, vice-presidente do grupo comercial National Retail Federation.
Isso significa que os consumidores provavelmente não verão impactos nas seções de roupas e brinquedos até começarem as compras de volta às aulas no outono.
“Com os varejistas operando com margens de lucro estreitas de 2% a 3%, não há muito espaço, infelizmente”, diz Gold. “Eles tentarão proteger os consumidores o melhor que puderem, mas acho que é preciso haver a percepção de que, infelizmente, alguns desses custos terão que ser repassados.”
Alguns consumidores começaram a estocar itens antes dos aumentos previstos, um movimento que Tedeschi afirma que apenas aumentaria preços mais rapidamente.
Em uma loja da Target no centro de Manhattan na tarde de quarta, prateleiras que normalmente continham água engarrafada, toalhas de papel e farinha estavam vazias. Funcionários disseram que, embora tivessem mais estoque na parte de trás da loja, os clientes estavam comprando itens não perecíveis mais rápido do que podiam reabastecê-los.
As vendas de vinho também estão em alta, pois os vendedores alertam que as tarifas os forçarão a parar de vender muitos rótulos importados de pequena produção e aumentar os preços de garrafas mais populares, diz Tom Wark, diretor executivo da National Association of Wine Retailers.
Se Trump reinstaurasse as “tarifas recíprocas”, uma garrafa de vinho europeu de US$ 30 custaria até US$ 50 em três semanas, estima.
Outros proprietários de negócios ainda estão lutando para se adaptar às tarifas.
“Este é o ponto em que você meio que levanta as mãos e espera para ver”, afirmou Joanne Kwong, presidente da Pearl River Mart, varejista com sede em Nova York que vende lanches, artigos para o lar, brinquedos e outros produtos importados de toda a Ásia.
“[As tarifas] não são sustentáveis para um pequeno negócio como o nosso e até para muitos maiores que o nosso. Em última análise, esse custo será suportado pelo consumidor.”
Amrita Saigal, fundadora da empresa de fraldas Kudos, disse que seu negócio provavelmente aumentaria os preços, mas a incerteza das tarifas tornou impossível planejar. Embora a Kudos fabrique seus produtos na Carolina do Norte e use algodão dos EUA, certas embalagens e componentes vêm da China.
“Por mais que tentemos absorver uma parte disso, provavelmente teremos que repassar uma parte para o cliente. Não é como se esse dinheiro estivesse sendo embolsado por nós”, disse ela sobre o custo das tarifas.
“Mesmo que eu quisesse trazer todos os componentes para os EUA, não há infraestrutura”, acrescentou.
Poucos itens enfrentam aumentos de preços tão acentuados quanto o café, 80% do qual é importado, de acordo com o departamento de agricultura dos EUA. Apenas pequenas áreas do Havaí e da Califórnia têm o clima propício para o cultivo dos grãos.
Ben Fung, dono da cafeteria Créme em Manhattan, disse que seus fornecedores já haviam planejado aumentar os preços em até 30% mesmo antes das tarifas entrarem em vigor, após uma seca no Brasil dizimar as colheitas.
Agora, as tarifas ameaçam aumentar o preço tanto do café La Colombe que Fung prepara quanto dos copos de papel em que ele serve, que são fabricados no Canadá. Ele espera que o aumento usual nos negócios durante o verão lhe permita manter o preço de um latte em US$ 5,50, mas reconsiderará no outono.
“Sou uma loja familiar. Vejo os mesmos rostos. Eles se tornam amigos e família, então sempre me sinto mal quando aumento os preços. Vou absorver o custo até que não seja mais sustentável, mas no final do dia, tenho que pagar as contas”, disse Fung.
Colaboraram Gregory Meyer e Patrick Temple-West em Nova York