Parte da ofensiva anunciada pela Comissão Europeia nesta quarta-feira (12) contra a tarifa de 25% sobre aço e alumínio dos EUA, uma lista com produtos americanos que poderão ser retaliados pelo bloco impressiona pela extensão, 99 páginas, e abrangência: vai de produtos alimentícios a bebidas, passando por diversos tipos de madeira e itens inusitados de vestuário, como camisola feminina.
O documento estará em fase de consulta de países e empresas do bloco até 25 de março. Depois disso, integrarão uma segunda fase de retaliação às importações americanas, que pode alcançar a cifra de 26 bilhões de euros ou R$ 164,9 bilhões. A primeira fase está desenhada com produtos que já foram objeto de retaliação em 2018 e 2020, durante o primeiro mandato de Donald Trump, para os quais já há previsão legal: 8 bilhões de euros em motocicletas Harley-Davidson, uísque tipo bourbon e jeans.
“As contramedidas que tomamos hoje são fortes, mas proporcionais. Como os EUA estão aplicando tarifas no valor de US$ 28 bilhões, estamos respondendo com contramedidas no valor de 26 bilhões de euros”, afirmou a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, em comunicado divulgado nesta manhã, horas depois das medidas americanas entrarem em vigor.
A preferência não é apenas por produtos icônicos dos EUA, mas também aqueles que são produzidos em estados com comando republicano, base política de Trump. “Nós adoramos soja, mas ficamos felizes em comprá-la do Brasil, da Argentina ou de qualquer outro lugar”, declarou um porta-voz da União Europeia, ao usar como exemplo o grão cultivado na Louisiana, o estado do presidente da Câmara americana, Mike Johnson.
“Tarifas são impostos. Elas são ruins para as empresas e ainda piores para os consumidores. Estão interrompendo as cadeias de suprimentos e trazem incertezas para a economia. Empregos estão em jogo. Os preços subirão. Na Europa e nos Estados Unidos”, resumiu Von der Leyen, até então muito cautelosa sobre o assunto.
A efetivação das alíquotas americanas, que também atingem o aço e o alumínio brasileiros, fez o bloco ser mais incisivo no tom dos discursos. António Costa, presidente do Conselho Europeu, e Olaf Scholz, primeiro-ministro alemão, expressaram em Berlim forte preocupação com a disputa comercial, que afeta mercados em quase todo o planeta e já deprime prognósticos de bancos e fundos de investimentos.
A ofensiva da União Europeia terá também disputas internas. França, Espanha e Itália foram os primeiros países a pedir modificações na lista de produtos americanos sujeitos a retaliação. Segundo uma empresa do setor de bebidas, os três países já advogam a exclusão de vinhos e destilados, provavelmente preocupados com o efeito da guerra tarifária em seus conhecidos equivalentes, com grande peso nas exportações.
A relação de produtos elaborada por Bruxelas é detalhada e ampla. Começa com pintinhos vivos, diversos tipos de alimentos em diferentes estágios de processamento, leite e derivados, ovos, castanhas, frutas, grãos, cafés, rações, tabaco, cigarro eletrônico e cosméticos; inclui ainda plásticos de diversos tipos, madeiras, produtos de limpeza, tapeçaria e roupas; a parte de vestuário é exaustiva e contempla de roupas de esqui a mais de um tipo de lingerie.
Benjamin Haddad, o chanceler francês, afirmou que a lista é só o começo e que “a União Europeia pode ir além”. Em entrevista à emissora TF1, declarou que as medidas “são proporcionais”. “Se chegássemos a uma situação em que tivéssemos que ir além, serviços digitais ou propriedade intelectual poderiam ser incluídos”, declarou.
A frente digital vem sendo especulada desde a posse de Trump, em janeiro, quando as big techs surpreenderam em atos públicos de adesão ao ideário trumpista. Mark Zuckerberg, da Meta, chegou a dizer que iria trabalhar “com o presidente Trump para pressionar os governos de todo o mundo que estão atacando as empresas americanas”.
O co-criador do Facebook mirava a recente legislação europeia, ainda em fase de implementação. A lei de serviços digitais (DSA) deve permitir que os europeus combatam o conteúdo ilegal e desinformação na internet, enquanto a lei de mercado digital (DMA) persegue monopólios. Em tese, as principais plataformas correm o risco de receber uma multa de até 6% de seu faturamento mundial no primeiro caso e de 10% no segundo. Elas também podem ser forçadas a reduzir suas atividades em solo europeu.
Parte dos analistas relaciona o populismo transformado em discurso de liberdade de expressão de figuras como Elon Musk e o vice-presidente americano, J.D.Vance, ao potencial estrago que as empresas americanas podem sofrer se a legislação europeia for levada a cabo.
A presidente do México, Claudia Sheinbaum, disse nesta quarta-feira (12) que seu governo não retaliará imediatamente as novas tarifas de 25% impostas pelos EUA sobre todas as importações de aço e alumínio e, em vez disso, aguardará uma possível resolução nas próximas semanas.
“Esperaremos até 2 de abril e, a partir daí, veremos se nossa definição de tarifas recíprocas também será aplicada”, disse Sheinbaum em sua coletiva de imprensa diária pela manhã.
As autoridades mexicanas disseram que as tarifas são injustificadas, apontando para dados que mostram que os EUA têm um superávit comercial de aço e alumínio com o México. As tarifas ameaçam uma economia mexicana já frágil, que está oscilando em direção a uma recessão técnica e enfrenta o maior déficit orçamentário desde a década de 1980.
Embora Sheinbaum tenha se mostrado uma negociadora hábil com Trump —conseguindo uma pausa em outras tarifas— ela pode ter dificuldades para obter os mesmos resultados com relação ao aço e ao alumínio.
O ministro da Economia do México, Marcelo Ebrard, já havia criticado as tarifas. “É injusto de acordo com os próprios argumentos do presidente Trump. Porque nós, repito, temos mais importações (de aço) do que exportações”, disse Ebrard em uma coletiva de imprensa em fevereiro.
A câmara mexicana do aço, Cancero, alertou que as tarifas atingiriam três quartos das exportações mexicanas de aço, no valor de US$ 2,1 bilhões, e pediu tarifas retaliatórias sobre o aço dos EUA.