Stephen Miran, doutor em economia por Harvard e indicado por Trump para a chefia da assessoria econômica do presidente, escreveu em novembro passado “Um manual para a reconstrução do sistema de comércio global”.
O diagnóstico é que a vantagem que os EUA têm de ser o emissor da moeda de curso global tem causado uma sobrevalorização da moeda americana, o que explica a queda da participação da indústria manufatureira e, no limite, a perda de empregos industriais para a China.
A proposta de Miran é atuar com tarifas de importação e no câmbio para construir um equilíbrio com o dólar mais desvalorizado em relação às demais moedas. O movimento tem paralelismo com o acordo celebrado no Hotel Plaza, em Nova York, em 1985.
As tarifas têm duas funções: aumentar a competitividade da economia americana na produção de bens manufaturados, estimulando a reindustrialização; 2) gerar receita para o Estado.
Em um regime de câmbio flutuante, a elevação das tarifas será, ao menos em parte, compensada por uma moeda mais forte. Se houver compensação total —isto é, se o preço doméstico dos bens, após as tarifas e com a nova taxa de câmbio, não se alterar—, não haverá impacto sobre a competitividade, mas haverá elevação de receita. Nesse caso, a tarifa será paga pelo exportador para a economia americana. Se houver compensação parcial, haverá uma melhora da competitividade da indústria americana.
Para o câmbio, há dois conjuntos de propostas. O primeiro é intervir mais ativamente comprando reservas. As compras seriam financiadas por meio de venda de títulos de curto prazo no mercado doméstico. Isto é, por meio de intervenções esterilizadas, como nós fizemos muito entre 2005 e 2010, por exemplo.
Para compensar o excesso de títulos de curto prazo no mercado, Miran propõe que os EUA usem o seu peso político para “estimular” os bancos centrais mundo afora que carregam reservas americanas a trocá-las, ao par, por títulos de longo prazo.
Fala-se em títulos com vencimentos em cem anos ou mesmo títulos perpétuos, muito populares na época vitoriana. Adicionalmente, sugere que se cobre uma “tarifa” pelo uso, pelos bancos centrais, das reservas americanas.
Seria uma forma, sugere Miran, de o mundo pagar pelo serviço de seguro fornecido pelas reservas. Evidentemente, essa tarifa ajudaria a melhorar as contas públicas, como ocorre com as tarifas de importação. Como contrapartida, os EUA se comprometeriam a oferecer linhas de liquidez, sempre que houvesse necessidade.
A impressão que se tem é que a proposta do assessor de Trump não atende às identidades macroeconômicas. Há um problema de déficit da balança comercial, segundo o assessor, que machuca a indústria. Para resolver o problema, propõem-se medidas que aumentam a renda que o resto do mundo envia aos EUA. A menos que a renda seja 100% poupada, isto é, aplicada em acumulação de ativos fora dos EUA, o déficit comercial irá aumentar ainda mais!
A mágica do assessor somente conseguirá reduzir o déficit comercial se houver queda da absorção doméstica, em geral aumento da poupança doméstica, ou se houver elevação da produção. A economia opera a plena carga —desemprego de 4% e produtividade crescendo a 2% ao ano nos últimos trimestres. Não parece haver espaço para grandes ganhos de produção.
O pacote do assessor não para de pé.
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